Uma nota sobre o Rota 2030: O “capitalismo” desejado pela indústria automobilística


Gibson Da Costa

 

Todos já se acostumaram à ladainha política contra tudo de “esquerda” no Brasil – seja lá o que “esquerda” signifique em 2018 –, aquela mesma ladainha que ajudou a eleger Jair Bolsonaro como o próximo Presidente da República. Os defensores do discurso da neodireita “nacional” tornaram-se os apóstolos da visão conservadora americana de que um “Estado mínimo” – isto é, um Estado que não se responsabilize pelo bem-estar social de seus cidadãos – seja o símbolo da “nova” civilização próspera que as elites econômicas e políticas desejam para si mesmos (e não para o todo da população). A diminuição na tributação de grandes empresas seria, para eles, o primeiro passo para o mundo novo que esperam.

As elites econômicas e políticas brasileiras têm sido bem-sucedidas em seu esforço de lobby junto ao Congresso e ao governo federal – mesmo nos governos descritos como de “esquerda”. De 2006 a 2018, através do Inovar-Auto e da redução do IPI (imposto sobre produtos industrializados), segundo a Instituição Fiscal Independente (órgão do Senado responsável pelo acompanhamento e fiscalização da política fiscal do governo federal), a indústria automobilística foi beneficiária de cerca de R$28 bilhões em subsídios do governo federal. Esse tipo de subsídios à indústria automobilística, a propósito, têm sido uma tradição brasileira desde fins da década de 1950, quando o governo de Juscelino Kubitschek de Oliveira, através do GEIA (Grupo Executivo da Indústria Automobilística), promoveu a instalação e atividades de montadoras automobilísticas multinacionais, as quais receberam auxílio financeiro do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BAER, 2008).

Entre 2013 e 2017, os subsídios a essa indústria custaram mais de R$5 bilhões ao contribuinte brasileiro, até que o programa Inovar-Auto fosse condenado pela Organização Mundial do Comércio. Agora, o governo brasileiro renova o antigo programa com um novo nome, chamando-o de “Rota 2030” – tendo o Presidente Michel Temer sancionado ontem a Lei nº 13.755/2018, que estabelece o programa. O mesmo estabelece que as empresas automobilísticas tenham descontados dos variados impostos os investimentos que façam em pesquisa e tecnologia.

A pergunta que pode e deve ser feita, em tempos de discursos pró-mercado, é se o financiamento de pesquisa e tecnologia por empresas que dependem dessas para seu lucro deve ser realmente pago pelos contribuintes que têm sofrido com o corte de investimentos públicos em “serviços” básicos. Além disso, que vantagens esses mesmos contribuintes têm como consequência desses subsídios, considerando que entre 2014 e 2016, só nas montadoras, houve um corte de mais de 30 mil vagas? Para não citar aquelas perdidas nas áreas correlatas como indústria de autopeças e concessionárias, que, junto com as montadoras, somaram uma perda de mais de 200 mil vagas (SILVA, 2016).

Por que os contribuintes brasileiros deveriam arcar com os custos que deveriam ser daqueles que desejam lucrar com o investimento (as montadoras multinacionais), se não terão garantia dum retorno significativo no custo do produto final ou da criação/manutenção de postos de trabalho?… Não é interessante esse capitalismo da indústria automobilística e das elites brasileiras?


Referências:

 

BAER, Werner. The Brazilian economy: growth and development. Boulder: Lynne Rienner Publishers, 2008.

SILVA, Cleide. Em dois anos, setor automotivo tem 200 mil cortes. Exame, 12 set. 2016. Disponível em: <https://exame.abril.com.br/economia/em-dois-anos-setor-automotivo-tem-200-mil-cortes/>. Acesso em: 12 dez. 2018.

 
 

A filosofia política liberal e o segundo turno das eleições presidenciais brasileiras

Um amigo me perguntou se eu votaria no candidato à Presidência que se identifica como “liberal” (Jair Bolsonaro). A lógica por trás de sua pergunta era a de que já que eu me identifico como um “liberal democrata” (de persuasão “social”), provavelmente votaria num candidato filiado a um partido com “social liberal” no nome e que diz defender uma política econômica “liberal”. Esse é um equívoco nominalista que gostaria de desfazer.

Liberalismo” é um termo complexo. Refere-se a diferentes conceitos, a depender dos contextos nos quais é utilizado. Há “liberalismos políticos” e “liberalismos econômicos” – a variedade teórica é tão grande que não se pode tratar desses como se fossem uma única forma de abordar a política ou a economia (exatamente como ocorre com conceitos como “socialismo” ou “marxismo”).

Politicamente, o liberalismo possui pelo menos duas faces:

A) Como tradição intelectual – enquanto filosofia moral e política –, o liberalismo representa um conjunto de ideias que têm se desenvolvido ao longo da modernidade. Encontra sua fundamentação inicial no pensamento de Locke e Montesquieu, mas se solidifica como uma filosofia específica apenas após a Revolução Francesa. Apresenta três princípios consensuais básicos, criticados por perspectivas mais à direita e/ou à esquerda do espectro político:

I. Ética individualista – isto é, o indivíduo como personagem central dos valores e direitos (por exemplo, a liberdade não é apenas um direito do ser humano, é um direito de cada indivíduo);

II. Respeito equitativo por todos os seres humanos, baseado na crença de que todos são igualmente capazes de se autogovernarem;

III. Liberdade de pensamento e expressão, baseada na confiança na autonomia irrestrita da razão (=capacidade racional do indivíduo) como única e suficiente fonte de verdade objetiva.

Esses princípios, obviamente, são criticados dentro da própria tradição liberal, mas têm servido de guia filosófico para o liberalismo enquanto filosofia moral e política.

B) Como ordenamento político-jurídico, o liberalismo têm se desenvolvido – para o bem ou para o mal – ao redor de três princípios gerais:

I. Liberdade equitativa para todos os cidadãos, o que inclui a liberdade de o indivíduo agir como escolher, desde que se sujeite às leis que protegem os direitos iguais dos outros;

II. A proteção da liberdade de pensamento e expressão desse pensamento;

III. A organização desses princípios num sistema jurídico que garanta a igualdade de cada cidadão perante a lei.

Perceberam que não incluí a noção de “democracia” nos princípios acima? E não o fiz porque a participação democrática do cidadão não esteve sempre presente na filosofia política liberal. É por isso que quando identifiquei meu ideário político o chamei de “liberal democrata” – para afirmar que a minha forma de liberalismo é democrática. Essa junção de “democracia” ao “liberalismo” é mais recente, tendo se desenvolvido apenas no século XX. Os antigos teóricos liberais temiam, muitas vezes, que a democracia irrestrita pudesse sabotar tanto os princípios filosóficos liberais quanto o ordenamento jurídico proposto por eles. [Essa preocupação fica mais clara se examinarem a chamada “psicologia das massas” e a “teoria das elites”.]

Há uma questão importante, entretanto, no que concerne aos princípios filosóficos que listei em [A] III – a razão como única e suficiente fonte de verdade objetiva. Filosoficamente, muitos liberais discordarão das implicações epistemológicas dessa afirmação – especialmente aqueles que, como eu, foram/são influenciados por uma perspectiva dita “pós-moderna”. Esses aceitam o princípio da liberdade de pensamento e expressão, mas podem rejeitar a epistemologia objetivista presente naquele princípio.

O que interessa aqui, entretanto, é refletir até que ponto o candidato do partido chamado “Social Liberal” se encaixaria nos princípios filosóficos que listei acima para o liberalismo [A]:

I. Até que ponto alguém que abertamente ataca indivíduos e/ou grupos sociais dos quais discorda – por exemplo, os identificados como LGBT+ ou como “esquerdistas” –, e cujo discurso cria todo um ambiente de ameaça e amedrontamento, exibe respeito pelo princípio de ética individualista (cada indivíduo tem valor e dignidade como ela/ele é ou está)?

II. Consequentemente, até que ponto esse mesmo candidato se ajusta ao princípio de que cada indivíduo, independentemente de quem seja, deva ser respeitado da mesma forma que os demais. Como exemplo: as(os) cidadã(o)s gays, feministas, comunistas, petistas, etc, não devem ser respeitados e honrados da mesma forma como os tradicionalistas, direitistas, cristãos, etc, o são?

III. Até que ponto alguém que apoia a aprovação de leis que restringem, por exemplo, a liberdade de cátedra, a liberdade de expressão de professores, representaria um ideário político liberal?

Eu poderia tratar aqui a respeito de, por exemplo, “ética distributiva” para discutir a questão da Previdência Social ou do programa Bolsa Família. Entretanto, não existe um consenso sobre ela no liberalismo como um todo – existe esse consenso, entretanto, na tradição chamada de “liberalismo social” (que ao menos nomeadamente declara ser a tradição do partido do candidato, e é minha tradição política de origem). Por isso, não importa discuti-la aqui, até porque o candidato se apresenta como economicamente liberal – o que, em outras palavras, significa que ele seria um adepto daquilo que é comumente chamado de “neoliberalismo”: ou seja, uma ideologia político-econômica rígida que enfatiza o livre mercado, um estado pequeno e forte, a iniciativa privada e a responsabilidade individual.

Em outras palavras, enquanto adepto da filosofia política liberal, não posso encontrar razões para votar num candidato como Jair Bolsonaro. Vejo, neste Segundo Turno, uma proximidade muito maior com o candidato do PT – apesar das muitas discordâncias no que concerne ao seu partido e ao seu Plano de Governo original.

Respondendo àquele amigo, digo que meu ideário filosófico liberal democrata e minhas perspectivas religiosas me motivam, de todos os lados, a votar e torcer pela derrota dum candidato que, filosoficamente, representa o contrário duma utopia liberal. Mas, obviamente, isso não significa que espero que os meus leitores aceitem minha posição. Só espero, francamente, que se acreditam naqueles valores que representam a filosofia política liberal, possam refletir antes do voto, e se escolherem o candidato do PSL, exijam seu compromisso com o respeito daqueles valores.

+Gibson

Os nazistas eram socialistas?: uma brevíssima resposta

A inscrição lê, em alemão, “Dia do Trabalho, 1934”.
A imagem é frequentemente divulgada por grupos da direita política – nos EUA, Brasil e outros países –
como eviência de que o Nazismo teria sido, na verdade, um movimento socialista e não de extrema direita.

Gibson da Costa

 

O contexto dessa atual “discussão” (ou seria acusação?!) nas redes sociais é o conflito por legitimação política de grupos que se identificam como “direita” no Brasil. Se vocês prestarem muita atenção aos textos que são divulgados online sobre o assunto – e estou pensando em sites como os do Instituto Mises e do Ilisp –, e analisarem quem os escreveram, onde, quando e suas razões, verão que suas conclusões atendem aos seus próprios interesses partidários.

Mas, permitam-me fazer algumas observações:

Apesar de o nome do partido nazista ter sido “Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães”, dizer que o mesmo era um partido “socialista” simplesmente por causa do nome é como dizer que “Little Brazil”, em Manhattan, seja uma parte da República Federativa do Brasil simplesmente por causa de como é chamado!

O nome do partido foi uma estratégia política para lidar com as oposições socialista e comunista, arrastando os “trabalhadores” alemães para as fileiras nazistas. No Brasil houve estratégias semelhantes, no que se refere a nomes de partidos: Getúlio Vargas fundou o Partido Trabalhista Brasileiro, ao fim de sua ditadura marcada pelo anticomunismo – ele era socialista simplesmente porque utilizou o termo “trabalhista” no nome do partido que fundou? Claro que não! O nome que deu ao partido foi simplesmente uma tática de propaganda para enfraquecer as oposições comunista e socialista; atualmente, o PFL, depois de uma história de rejeição por conta de seu passado, se refundou em 2007 como “Democratas” – percebem que o nome pode fazer com que pessoas menos informadas criem uma conexão entre o DEM e o Partido Democrata americano?; o PSDB é o Partido da Social Democracia Brasileira – e vocês poderiam se perguntar: “social democracia”? Sério?!

Então, supor que os nazistas formassem um partido “socialista” simplesmente porque os termos “socialista” e “trabalhadores” aparecem em seu nome é fechar os olhos para as táticas políticas utilizadas para conquistar apoio eleitoral ou miliciano. Na verdade, o nazifascismo como um todo e o nazismo em particular são temas que merecem muito mais cuidado do que essa simplificação de “direita” versus “esquerda”. Eugen Weber, por exemplo, chamava essas classificações do fascismo como “direita” ou “esquerda” de estereótipos anacrônicos – e eu não poderia pensar em melhor qualificativo! O nazismo encontra suas origens ideológicas em variadas tradições, tanto em termos de ligações diretas quanto em conexões aleatórias. Como afirmam Peter Davies e Derek Lynch, os nazistas souberam “identificar, cooptar e perverter ideias e conceitos para seu próprio uso e para fins de credibilidade” (2002: 90).

A tolice dos comentários expostos em sites como os do Instituto Mises ou do Ilisp é que se tratam de observações presas a perspectivas econômicas anacrônicas – ou seja, além de limitarem um tema tão amplo a questões econômicas, projetam sobre o passado circunstâncias e questões do presente, desconsiderando os contextos dos atores históricos daquela época. A retórica utilizada – seguindo a mesma lógica dos livros didáticos de história da década de 1980, por exemplo – tenta criar uma oposição entre “socialismo” e “capitalismo” no que tange a aspectos econômicos. Entretanto, o nazifascismo não possui uma relação de origem direta com a economia em si, mas sim com o nacionalismo de Estado e tudo o que ele significava (ao menos de acordo com um grande número de autores, como Weber, Mann, Mommsen, Siegelbaum, Lüdtke, Hoffmann, Geyer, Lynch, Thorpe, Paxton, Griffin etc).

Ademais, os próprios autores desses textos divulgados nos sites da neodireita brasileira não demonstram uma compreensão histórica do termo “capitalismo”. Ser contrário ao “capitalismo”, no contexto do entreguerras, não significava ser “socialista”. “Capitalismo” se referia a um sistema regido pelas corporações, o discurso desses líderes políticos nacionalistas europeus enfatizava a lealdade à “nação”; ou seja, criavam uma oposição entre “nação” e “corporações” – atualmente, o mesmo conceito se encontra, por exemplo, na retórica de Donald Trump. Independentemente do nome que se dê às posições políticas de certos atores (direita, esquerda, liberal, socialista, anarquista, comunista etc), se se opunham ao domínio de corporações, eles se declaravam anticapitalistas!… Mussolini e Hitler são exemplos claros disso nos movimentos ultradireitistas.

A faixa diz, em alemão, “Morte ao marxismo”.

Por que, então, o nazifascismo é identificado como sendo de direita, mesmo possuindo certos traços aparentemente socialistas?

Retomo a adjetivação utilizada por Eugen Weber para se referir a essas classificações dos movimentos fascistas como sendo de “direita” ou “esquerda”: tratam-se de estereótipos anacrônicos!… A obsessão com seu uso, como bem demonstram os sites de propaganda da neodireita brasileira, parece ter mais a ver com legitimação política do que com historiografia.

Entretanto, há várias razões para identificar os movimentos fascistas como “[ultra]direitistas”. Uma delas é o simples fato de tanto os grupos que lideravam esses movimentos quanto o cerne das ideias que defendiam ter tido suas origens naquilo que se chamava de “direita”. O vocabulário que buscava falsear os conceitos utilizados por socialistas – “socialismo”, “trabalhadores” etc – mascaravam o fato de ideias e conceitos socialistas terem sido pervertidos para que os partidos fascistas encontrassem legitimidade dentre o eleitorado e as organizações trabalhistas. Dentre suas bandeiras, encontravam-se: a compreensão da “nação” como uma entidade orgânica, integral e transcendente, que deveria ser defendida de seus inimigos internos e externos; a preocupação com o vigor nacional e sua defesa contra elementos que o pusessem em perigo; a noção de destino especial; a preocupação com pureza racial; o anti-intelectualismo; um comunitarismo necessário àquela compreensão de “nação” etc.

Sim, é verdade que nazifascistas e comunistas partilhavam de muitas ideias, mas quando estudamos a história política, não avaliamos os atores apenas com base no vocabulário que utilizam ou nas noções que dizem defender – avaliamos, principalmente, suas ações, quem eram, com quem se associavam, quem perseguiam etc. E é com base nisso que o nazifascismo tem sido caracterizado como de “direita” – independentemente do quão anacrônicos e inapropriados sejam os termos “direita” e “esquerda”.

 
 

Referências citadas:

DAVIES, Peter; LYNCH, Derek. The Routledge Companion to Fascism and the Far Right. Nova York: Routledge, 2002.

WEBER, Eugen. Revolution? Counterrevolution? What Revolution?. In: Journal of Contemporary History, Vol. 9, No. 2 (Apr., 1974), p.3-47.

 
 

“A violência… você combate com violência”, afirma Bolsonaro

Resolvi encontrar online a entrevista de Danilo Gentili com Jair Bolsonaro, e me forcei a assisti-la. Queria dar uma oportunidade ao mal-afamado deputado brasileiro para desfazer quaisquer preconceitos que tinha contra ele. E, confesso, não me surpreendi com absolutamente nada – a não ser com o fato de ele ser pago para representar seus eleitores, ou, antes, com o fato de haver eleitores que comprem tal tipo de discurso em pleno século XXI.

Quando Jair Bolsonaro dá voz à sua estreita visão de mundo (e, enquanto Deputado, à sua visão inconstitucional), ancorada no saudosismo da Guerra Fria, só prova que não possui uma compreensão do Estado Democrático de Direito que sua função de Deputado Federal deveria representar. Ele, talvez, não tenha lido ou compreendido os artigos iniciais da Constituição à qual deveria se submeter, tanto como cidadão quanto (principalmente) como Deputado:

Art. 1º. A República Federativa do Brasil, […] constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

[…]

III – a dignidade da pessoa humana;

[…]

Art. 3º. Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

I – construir uma sociedade livre, justa e solidária;

[…]

III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;

IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Art. 4º. A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios:

[…]

II – prevalência dos direitos humanos;

[…]

VI – defesa da paz;

VII – solução pacífica dos conflitos;

[…]

Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

[…]

III – ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante;

[…]

XL – a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu;

[…]

XLVII – não haverá penas:

a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX;

b) de caráter perpétuo;

c) de trabalhos forçados;

d) de banimento;

e) cruéis;

[…]

XLIX – é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral;

[…]

LIII – ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente; […]

Os artigos não são reflexo duma “política de direitos humanos” que, para o entrevistado, significaria um obstáculo ao que chama de segurança pública. Antes, as políticas que lidam com questões referentes aos direitos humanos é que têm sua origem na Constituição Federal. Assim, defender os direitos de qualquer pessoa que tenha sido flagrada em delito ou condenada como criminosa não é “defender marginal”; é, antes, defender a Constituição!

O artigo 5º assevera a inviolabilidade do direito à vida de todos os cidadãos brasileiros ou estrangeiros residentes no país; desta forma, as propostas do deputado é que desrespeitam a Constituição brasileira. Como agente do Estado, ele deve saber que suas ações e palavras devem estar apoiadas nos princípios e normas constitucionais. Afirmar que “A violência… você combate com violência” é violar esses princípios e normas. De acordo com a Constituição Federal, a violência se combate com a lei!… E isso, a propósito, não é ser “politicamente correto”, é se submeter à Constituição – a base do Estado Democrático de Direito brasileiro!

A ignorância do suposto pré-candidato à Presidência acerca da Lei chega a ser assustadora e patética; especialmente quando se põe a “trumpizar” seu discurso, tratando sobre questões como a imigração. O deputado, provavelmente, não sabe que o Brasil é parte duma comunidade chamada “Mercosul”, e não sabe que há obrigações ligadas à membresia nessa comunidade para com os demais membros!

Por fim, para não dizer que não apreciei nada que tenha dito, concordo com suas seguintes palavras: “Não tem solução fácil para o Brasil e não existe salvador da pátria para o nosso país.” Essa é uma confissão que deveria ressoar nos ouvidos de seus admiradores. Realmente não existe salvador da pátria algum: Bolsonaro não é a salvação do Brasil!

Heil, Trump!… ou… Trump, o grande pai da América!

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Fonte: WGCL – TV Atlanta, CBS 46

Confesso que não sei o que pensar quando vejo os comentários de certos conhecidos sobre o pronunciamento de posse de Donald Trump ontem. Algumas dessas pessoas – brasileiros, a propósito – me surpreendem por aparentemente não se darem conta do que estava por trás daquelas palavras e, assim, aplaudirem o absurdo como se fora fonte de esperança política.

Permitam-me, então, apontar algumas coisas que ouvi naquelas palavras:

Juntos determinaremos os rumos da América e do mundo por muito tempo.

Significaria isso que a visão política de Trump não é a de um Império que influencie o mundo, levando liberdade e democracia aos povos “não livres”, contribuindo para a paz e estabilidade das relações internacionais (a tradicional noção dum “Império do bem”), mas, antes, a de um “Reich” que domina com pulso de ferro por um milênio?

Eu nem precisaria ser um professor de História para reconhecer os gritos do passado aqui. E não, não se trata apenas duma horripilante semelhança discursiva a diferentes tradições fascistas. Trata-se, principalmente, dum retorno àquela pior forma de “excepcionalismo” americano – do qual, na verdade, nenhum Presidente americano (incluindo o próprio Barack Obama) se afastou plenamente até agora.

O ponto importante, aqui, é observar a escolha dos termos usados por Trump: “determinaremos os rumos da América e do mundo por muito tempo” é afirmar que agora emerge um “povo” que, sozinho, delimitará/fixará/definirá/estabelecerá/precisará o futuro de todo o planeta. E não era exatamente essa a visão de “Reich” dos nazistas?… Se esse Império emerge a partir de agora, então Trump, como o “primeiro dos cidadãos”, seria o Imperador não apenas do mundo inteiro, mas também seria o senhor do próprio tempo.

Especialmente para os ouvintes cristãos devotos – mas também judeus ou muçulmanos – aquela pequena frase deveria causar um intenso desconforto. Ali estava um Presidente prometendo que determinará, junto com seu “povo”, os destinos da Terra por muito tempo a partir de agora.

“A cerimônia de hoje, entretanto, tem um significado muito especial. Pois hoje não estamos meramente transferindo poder de uma administração a outra, ou de um partido a outro – estamos transferindo poder de Washington e devolvendo-o a vocês, o povo americano.

Por muito tempo, um pequeno grupo na capital de nossa nação tem colhido as recompensas do governo enquanto o povo tem arcado com os custos. Washington floresceu – mas o povo não partilhou de sua riqueza. Os políticos prosperaram – mas os empregos se foram e as fábricas fecharam.

Os poderosos se protegeram, mas não aos cidadãos de nosso país. As vitórias deles não foram suas vitórias; os triunfos deles não foram seus triunfos; e enquanto celebravam na capital de nossa nação, havia pouco a ser celebrado pelas famílias em dificuldade ao redor do país.

Tudo isso mudará – começando aqui mesmo e agora mesmo, pois este momento é o seu momento: ele pertence a você.”

Você consegue perceber o teor populista do trecho? O populismo poderia ser definido justamente como essa retórica política baseada na vilificação moral das elites e na veneração do povo comum para proveito do político populista. Só que, obviamente, essa retórica se esconde do espelho – já que, do contrário, o espelho refletiria a imagem daquele político como parte da elite que ele mesmo condena.

De fato, Trump não era, até agora, um “político” profissional. Mas ele também é membro da casta que “colheu das recompensas do governo”. Em 2013, por exemplo, recebeu um desconto de 40 milhões de dólares de impostos em um de seus investimentos – um imóvel em Washington, D.C. (de acordo com um relatório sobre descontos de impostos, assinado pelo Senador James Lankford [republicano], de 2015). Logo após o 11 de setembro de 2001, foi formado um fundo de apoio a microempresas da vizinhança do World Trade Center, e quem recebeu dinheiro naquela época, de acordo com uma auditoria federal de 2006? Sim, a não microempresa de Donald Trump recebeu 150 mil dólares de apoio federal!!!

Sim, o mesmo bilionário que sempre desfrutou de subsídios do governo federal e de governos estaduais e municipais para benefício de seus investimentos imobiliários – incluindo os 40 anos de abatimento de impostos pela reforma do antigo Hotel Commodore, em Nova York, em 1980, e, mais tarde, os quase 200 milhões de dólares para construir uma ligação entre uma rodovia e um outro de seus hotéis – agora ousa acusar outros por terem colhido “das recompensas do governo”. Ele se apresenta como a solução e cura, mesmo quando qualquer pessoa mediocremente informada sabe sobre alguns dos benefícios que tem recebido desde 1980.

O seu pronunciamento é, então, um ícone da pior forma de populismo possível!

Deste dia em diante, será a América primeiro.

Todos já conhecem minha repulsa à expressão “America First” (=a América [EUA] Primeiro), que encapsula em si uma horripilante história imoral de violência. Esse foi o slogan do “America First Committee” que se tornou uma organização de apoio ao Nazismo, disfarçada de movimento pela paz. Sua “paz”, com a liderança de Charles Lindbergh, era evitar que os E.U.A. declarasse guerra à Alemanha, durante a 2ª Guerra, impedindo que os nazistas exterminassem as populações judaicas.

Com Trump, esse eco pavoroso do passado ganha um novo sentido e uma outra dimensão. Os “pobres” (no jargão político americano, os derrotados no domínio da virtude empreendedora), os muçulmanos, os imigrantes e os países que recebem algum tipo de ajuda dos E.U.A. passam a encarnar um obstáculo à suposta grandeza americana.

O Império, ou melhor, o “Reich” passa a não ter mais nenhuma responsabilidade para com os dominados. A raça superior vence as inferiores na corrida pelo domínio de 1000 anos, e como estão em disputa, os superiores não precisariam se importar com os seus dominados! Parece ser uma materialização da websérie de história contrafactual “The Man in the High Castle” – a diferença é que ali é a realidade sendo fantasiada; já aqui, a fantasia é que é realizada!

Tantas coisas são feias e trágicas nessa história toda. Uma das piores é o fato de brasileiros historicamente iletrados aplaudirem aquele pronunciamento, e o personagem que o emitiu, porque o que disse se assemelha aos preconceitos que eles mesmos abraçam. Talvez não tenham compreendido que aquela foi uma mensagem para os “parasitas” da América – e que eles se encaixam nessa descrição!

+Gibson

Toxicity: o álbum explosivo e inesquecível

Gibson da Costa

 Il n'y a qu'un problème philosophique vraiment sérieux: c'est le suicide.

[Há apenas um problema filosófico realmente sério: é o suicídio.]

(Albert Camus)
 

Era setembro de 2001. Enquanto os Estados Unidos eram sacudidos pelos atentados de 11 de setembro, o novo álbum da banda System of A Down (ou “SOAD”, para os íntimos), “Toxicity” – lançado no dia 4 daquele mês – estremecia os ouvidos do público americano. A música hereticamente surrealista e tóxica duma banda de “hard rock” criou o primeiro grande reboliço político contra artistas após o 11 de setembro. A vertiginosa “Chop Suey!” foi incluída numa lista de canções inapropriadas para serem tocadas nas rádios após os ataques terroristas e outras canções foram criticadas por seu conteúdo “questionável”. E o álbum se tornou o número 1 nas listas dos mais ouvidos e comprados naquela semana de setembro.

Considero os três maiores sucessos do álbum – Chop Suey!, Toxicity e Aerials – como as grandes pérolas do rock da primeira década do século XXI. As melodias, as poesias e as vozes se juntam para formar três grandes hinos políticos dos últimos tempos – e “hinos políticos” por conta não apenas de sua beleza desordeira, mas também por causa do contexto histórico no qual se tornaram sucesso massificado. Um sucesso, aliás, construído pela união da criação artística à retórica política, moldado por uma campanha de marketing articulada pela MTV – que mesmo após a campanha contra a transmissão da canção pelas rádios, repetidamente exibia o vídeo na emissora. O banimento da canção acabou sendo vencido por seu próprio absurdo no mundo da cultura de massa, e o álbum, atacado por políticos, religiosos e amantes das chamadas “teorias da conspiração”, se tornou um ícone do rock do início deste século.

 

Em “Chop Suey!”, ouvimos o trecho-problema:

[…] I don't think you trust
 In my self-righteous suicide
 I, cry, when angels deserve to die

[…]

Father into your hands, I commend my spirit
 Father into your hands
 why have you forsaken me
 In your eyes forsaken me
 In your thoughts forsaken me
 In your heart forsaken me […]

(Não acho que você confie
em meu suicídio hipócrita,
eu choro quando anjos merecem morrer

[…]

Pai, em suas mãos, entrego meu espírito
Pai, em suas mãos
Por que você me abandonou?
Em seus olhos, me abandonou
Em seus pensamentos, me abandonou
Em seu coração, me abandonou…)

E essas palavras bastaram para o início da caça às bruxas (ou seria “aos bruxos”?) contra o SOAD. Estariam eles incentivando ataques suicida contra os E.U.A.?

 

Nenhuma resposta poderia ser mais provocadora do que a dada pelo próprio Serj Tankian, coautor da canção e vocalista da banda, logo após os ataques de 11 de setembro:

"Os ataques/bombardeios brutais desta semana, em Nova York e Washington, juntamente com ameaças de ataques lá e em outras partes do país mudaram nossa época para sempre. Enquanto a mídia de massa se concentra nos detalhes da destruição e nas palavras encobertas dos políticos, tentarei entender e explicar os eventos a partir da cerca. BOMBARDEAR E SER BOMBARDEADO SÃO AS MESMAS COISAS NOS DIFERENTES LADOS DA CERCA.
 
 O terror não é uma ação humana espontânea sem crédito. As pessoas simplesmente não sequestram aviões e cometem harikari (suicídio) sem pensar antes de agir. Ninguém na mídia parece se perguntar POR QUE ESSAS PESSOAS FIZERAM ESSE TERRÍVEL ATO DE VIOLÊNCIA E DESTRUIÇÃO? […]"

Disponível em: <http://www.blabbermouth.net/news/archive-news-sep-14-2001-2/>. Acesso: 20 jan. 2017.

[Tradução livre nossa]

E o autor continua, oferecendo sua explicação e suas sugestões para a solução do problema do “harikari”. Sua receita antiviolência se assemelhando àquela oferecida pelas grandes tradições religiosas: a segurança e a sobrevivência só seriam alcançadas através da paz! A receita, embalada por um som pesado, intrigas políticas e uma massiva campanha de marketing pode levantar uma questão sobre a arte engajada do mundo do livre mercado: o rock, agora parte da cultura pop, ainda funciona como manifesto político (mesmo quando se vende como simples mercadoria comercializável)?

As outras pérolas do álbum:

 

Donald Trump: O discurso maniqueísta quase-fascista venceu, mas não pelo voto popular

Gibson Da Costa

O derrotado pelo voto popular, mas vencedor no Colégio Eleitoral, assume a Presidência dos Estados Unidos da América hoje. Mas será mesmo que o seu discurso salvacionista-maniqueísta – sua retórica [quase-]fascista – reflete os anseios da maioria esmagadora dos eleitores americanos?

Hillary Clinton venceu Donald Trump em quase 2.9 milhões dos votos populares – isto é, os votos dados por eleitores comuns. Trump venceu as eleições porque conseguiu um número maior de eleitores no Colégio Eleitoral. Ou seja, o sistema eleitoral maluco que ele mesmo tanto criticou durante a campanha foi o único responsável por sua vitória – mesmo considerando a alta porcentagem dos votos populares que obteve. (Ele, a propósito, não foi o primeiro a perder o voto popular, mas vencer no Colégio Eleitoral.) Se o sistema eleitoral americano fosse como o brasileiro, consistindo na contagem dos votos diretos para Presidente dados pelos próprios eleitores (1 eleitor = 1 voto), ele não teria ganho desta vez!

O ponto importante é que seu discurso salvacionista-maniqueísta, sua retórica [quase-]fascista, não foi comprada pela maioria esmagadora dos eleitores americanos – como alguns pensam. Para que você tenha uma ideia, eis a porcentagem dos votos populares recebidos pelos principais candidatos a Presidente dos E.U.A. em 2016:

Hillary Clinton (Partido Democrata) → 48,2% (65.844.954 votos)

Donald Trump (Partido Republicano) → 46,1% (62.979.879 votos)

Gary Johnson (Partido Libertário) → 3,3%

Jill Stein (Partido Verde) → 1%

O resto dos votos se distribuíram entre outros candidatos minoritários. (Esses dados, a propósito, estão atualizados até 22/12/2016.)

Eleições presidenciais dos E.U.A. de 2016: voto no exterior, partidos e candidatos

Gibson da Costa

Em 2011, o Departamento de Estado dos Estados Unidos estimava a população de cidadãos americanos residentes no Brasil em cerca de setenta (70) mil – nesse número estão incluídos também aqueles que possuam a cidadania brasileira (seja por terem originalmente nascido no Brasil, por serem filhos de brasileiros ou por terem passado por processo de naturalização no país) [1]. Esse número, obviamente, não é exato e não reflete o número de eleitores americanos no Brasil – isto é, de cidadãos americanos registrados como eleitores, residentes em território brasileiro –, mas, ainda assim, poderia servir de razão suficiente para que brasileiros se interessassem em saber como funciona o sistema eleitoral americano.

Diferentemente do que ocorre no Brasil, votar não é uma obrigação da cidadania americana – é, antes, um “privilégio”. Por isso, nem todos os cidadãos participam das eleições; nas eleições presidenciais de 2012, por exemplo, o número de cidadãos que votaram, comparado à população em idade eleitoral, foi de apenas 57,5%, de acordo com o relatório do Bipartisan Policy Center para as eleições daquele ano. De acordo com o mesmo relatório, o Estado de Utah, por exemplo, teve a participação de apenas 12,5% dos cidadãos em idade eleitoral [2].

Cidadãos americanos podem votar de qualquer lugar do mundo. Esse voto, contudo, não ocorre em consulados americanos, já que – diferentemente do Brasil – é proibido votar em dependências diplomáticas americanas no exterior. O voto é realizado, geralmente, pelos correios, através do envio de uma ficha eleitoral oficial que foi previamente enviada ao eleitor pelo Estado no qual o mesmo está registrado – mas também há outras formas de registro de votos vindos do exterior, a depender do Estado em questão. Isso pode fazer com que, em alguns Estados, a apuração dos votos leve dias para ser oficialmente concluída, já que devem esperar a contagem dos votos dos cidadãos no exterior (ou em outros Estados americanos). É um sistema extremamente complexo e fragmentado, quando comparado ao brasileiro!

Diferentemente do caso de brasileiros no exterior, é possível participar mesmo de eleições estaduais e/ou municipais, além das federais, estando no exterior ou em um Estado diferente do Estado de domicílio oficial. Como as leis eleitorais são estaduais, as regras mudam a depender do Estado onde o eleitor esteja originalmente registrado (isto é, do Estado no qual o eleitor tenha, de direito, “domicílio”). O Estado de domicílio, para os cidadãos que não residem mais nos E.U.A. (mesmo que nunca mais voltem ao país), é o último Estado de residência antes de deixar o território americano – são as leis desse Estado que determinam as regras às quais o eleitor deve se submeter.


Dos candidatos de 2016

Um equívoco comum fora dos Estados Unidos é pensar que haja apenas dois partidos políticos no país e, consequentemente, apenas dois candidatos à Presidência da União. A factualidade é bem diferente disso.

Há, literalmente, algumas centenas de partidos políticos nos E.U.A. A razão é simplesmente porque, diferentemente do Brasil, é possível haver partidos registrados apenas num município ou num Estado. Atualmente, há 36 partidos cujos filiados ocupam posições eletivas em algum nível (municipal, estadual ou federal). Desses, 8 possuem filiados nos executivos e legislativos estaduais: Partido Republicano, Partido Democrata, Partido Progressista [do Estado] de Vermont, Partido Libertário, Partido das Famílias Trabalhadoras, Partido Conservador do Estado de Nova York, Partido da Independência de Nova York, e os Independentes (que são políticos que concorrem sem estar filiados a um partido, mas que, são contados como um bloco quase-partidário). Os maiores partidos americanos, isto é, partidos que estão presentes em quase todos os Estados da União, são: Partido Republicano, Partido Democrata, Partido Libertário e Partido Verde. E os candidatos desses partidos são os nomes que possuiriam, em tese, alguma chance de serem escolhidos como Presidente dos Estados Unidos – já que seus nomes aparecem nas listas de votação de quase todos os Estados (os republicanos, democratas e libertários estão em todos os 50 Estados e no Distrito de Colúmbia; o Partido Verde é que não alcança todos os Estados).

Você, leitor, obviamente já conhece dois desses candidatos (e eu me esforçarei para guardar minhas opiniões sobre eles para mim mesmo!): Donald Trump, o candidato do Partido Republicano; e Hillary Clinton, a candidata do Partido Democrata. Esses são os candidatos que possuem mais recursos financeiros para gastarem os milhões e milhões de dólares que precisam para se promoverem. É por essa razão que todos os presidentes eleitos desde meados do século XIX sempre pertenceram a uma dessas duas agremiações. Candidatos de outras agremiações são chamados de “candidato de terceiro partido”. E a última vez em que um candidato de terceiro partido a Presidente conseguiu votação significativa foi em 1968, quando Ross Perot, um Independente (ou seja, não filiado a nenhum partido) alcançou 5% dos votos.

Os dois outros candidatos majoritários são Gary Johnson, do Partido Libertário, e Jill Stein, do Partido Verde. Além deles, outros candidatos presentes nas listas de votação de vários Estados são: Darrell Castle (Partido da Constituição), Evan McMullin (Independente), Gloria LaRiva (Partido do Socialismo e Libertação), Rocky de la Fuente (Partido da Reforma), Emidio Soltysik (Partido Socialista), Alyson Kennedy (Partido Socialista dos Trabalhadores), e mais cerca de 550 candidatos que ainda não abandonaram a disputa!

Então, como se vê, a redução das eleições àqueles dois candidatos que aparecem nos telejornais diários, ao redor do mundo, é um desserviço à democracia eleitoral americana, e contribui para o desconhecimento que a maioria das pessoas ao redor do mundo tem sobre a política interna dos Estados Unidos.

[1] Brazil-U.S. Bilateral Relations Fact Sheet. US Department of State. Disponível em: <https://www.state.gov/outofdate/bgn/brazil/191355.htm>. Acesso em: 11 out. 2016.

[2] Bipartisan Policy Center. 2012 Voter Turnout Full Report. Disponível em: <http://cdn.bipartisanpolicy.org/wp-content/uploads/sites/default/files/2012%20Voter%20Turnout%20Full%20Report.pdf>. Acesso em: 11 out. 2016.