Gibson da Costa
Em 2011, o Departamento de Estado dos Estados Unidos estimava a população de cidadãos americanos residentes no Brasil em cerca de setenta (70) mil – nesse número estão incluídos também aqueles que possuam a cidadania brasileira (seja por terem originalmente nascido no Brasil, por serem filhos de brasileiros ou por terem passado por processo de naturalização no país) [1]. Esse número, obviamente, não é exato e não reflete o número de eleitores americanos no Brasil – isto é, de cidadãos americanos registrados como eleitores, residentes em território brasileiro –, mas, ainda assim, poderia servir de razão suficiente para que brasileiros se interessassem em saber como funciona o sistema eleitoral americano.
Diferentemente do que ocorre no Brasil, votar não é uma obrigação da cidadania americana – é, antes, um “privilégio”. Por isso, nem todos os cidadãos participam das eleições; nas eleições presidenciais de 2012, por exemplo, o número de cidadãos que votaram, comparado à população em idade eleitoral, foi de apenas 57,5%, de acordo com o relatório do Bipartisan Policy Center para as eleições daquele ano. De acordo com o mesmo relatório, o Estado de Utah, por exemplo, teve a participação de apenas 12,5% dos cidadãos em idade eleitoral [2].
Cidadãos americanos podem votar de qualquer lugar do mundo. Esse voto, contudo, não ocorre em consulados americanos, já que – diferentemente do Brasil – é proibido votar em dependências diplomáticas americanas no exterior. O voto é realizado, geralmente, pelos correios, através do envio de uma ficha eleitoral oficial que foi previamente enviada ao eleitor pelo Estado no qual o mesmo está registrado – mas também há outras formas de registro de votos vindos do exterior, a depender do Estado em questão. Isso pode fazer com que, em alguns Estados, a apuração dos votos leve dias para ser oficialmente concluída, já que devem esperar a contagem dos votos dos cidadãos no exterior (ou em outros Estados americanos). É um sistema extremamente complexo e fragmentado, quando comparado ao brasileiro!
Diferentemente do caso de brasileiros no exterior, é possível participar mesmo de eleições estaduais e/ou municipais, além das federais, estando no exterior ou em um Estado diferente do Estado de domicílio oficial. Como as leis eleitorais são estaduais, as regras mudam a depender do Estado onde o eleitor esteja originalmente registrado (isto é, do Estado no qual o eleitor tenha, de direito, “domicílio”). O Estado de domicílio, para os cidadãos que não residem mais nos E.U.A. (mesmo que nunca mais voltem ao país), é o último Estado de residência antes de deixar o território americano – são as leis desse Estado que determinam as regras às quais o eleitor deve se submeter.
Dos candidatos de 2016
Um equívoco comum fora dos Estados Unidos é pensar que haja apenas dois partidos políticos no país e, consequentemente, apenas dois candidatos à Presidência da União. A factualidade é bem diferente disso.
Há, literalmente, algumas centenas de partidos políticos nos E.U.A. A razão é simplesmente porque, diferentemente do Brasil, é possível haver partidos registrados apenas num município ou num Estado. Atualmente, há 36 partidos cujos filiados ocupam posições eletivas em algum nível (municipal, estadual ou federal). Desses, 8 possuem filiados nos executivos e legislativos estaduais: Partido Republicano, Partido Democrata, Partido Progressista [do Estado] de Vermont, Partido Libertário, Partido das Famílias Trabalhadoras, Partido Conservador do Estado de Nova York, Partido da Independência de Nova York, e os Independentes (que são políticos que concorrem sem estar filiados a um partido, mas que, são contados como um bloco quase-partidário). Os maiores partidos americanos, isto é, partidos que estão presentes em quase todos os Estados da União, são: Partido Republicano, Partido Democrata, Partido Libertário e Partido Verde. E os candidatos desses partidos são os nomes que possuiriam, em tese, alguma chance de serem escolhidos como Presidente dos Estados Unidos – já que seus nomes aparecem nas listas de votação de quase todos os Estados (os republicanos, democratas e libertários estão em todos os 50 Estados e no Distrito de Colúmbia; o Partido Verde é que não alcança todos os Estados).
Você, leitor, obviamente já conhece dois desses candidatos (e eu me esforçarei para guardar minhas opiniões sobre eles para mim mesmo!): Donald Trump, o candidato do Partido Republicano; e Hillary Clinton, a candidata do Partido Democrata. Esses são os candidatos que possuem mais recursos financeiros para gastarem os milhões e milhões de dólares que precisam para se promoverem. É por essa razão que todos os presidentes eleitos desde meados do século XIX sempre pertenceram a uma dessas duas agremiações. Candidatos de outras agremiações são chamados de “candidato de terceiro partido”. E a última vez em que um candidato de terceiro partido a Presidente conseguiu votação significativa foi em 1968, quando Ross Perot, um Independente (ou seja, não filiado a nenhum partido) alcançou 5% dos votos.
Os dois outros candidatos majoritários são Gary Johnson, do Partido Libertário, e Jill Stein, do Partido Verde. Além deles, outros candidatos presentes nas listas de votação de vários Estados são: Darrell Castle (Partido da Constituição), Evan McMullin (Independente), Gloria LaRiva (Partido do Socialismo e Libertação), Rocky de la Fuente (Partido da Reforma), Emidio Soltysik (Partido Socialista), Alyson Kennedy (Partido Socialista dos Trabalhadores), e mais cerca de 550 candidatos que ainda não abandonaram a disputa!
Então, como se vê, a redução das eleições àqueles dois candidatos que aparecem nos telejornais diários, ao redor do mundo, é um desserviço à democracia eleitoral americana, e contribui para o desconhecimento que a maioria das pessoas ao redor do mundo tem sobre a política interna dos Estados Unidos.
[2] Bipartisan Policy Center. 2012 Voter Turnout Full Report. Disponível em: <http://cdn.bipartisanpolicy.org/wp-content/uploads/sites/default/files/2012%20Voter%20Turnout%20Full%20Report.pdf>. Acesso em: 11 out. 2016.